
A central de operações informa que um veículo da marca “X” de cor “Y”  acaba de efetuar um assalto em determinada localidade. Informa ainda  que o carro suspeito encontra-se nas proximidades de onde a viatura da  guarnição “Z” está. A placa é desconhecida, mas a guarnição acaba  encontrando um veículo “X” de cor “Y”, semelhante à descrição da  central, passando devagar ao lado da viatura. A película nos vidros é  escura, e não dá sequer para saber quantos ocupantes estão no veículo.
Neste momento, o que a guarnição policial deve fazer? Atirar no  veículo suspeito – correndo o risco de acertar em inocentes ou mesmo em  criminosos que não estejam esboçando reação? Acompanhar o veículo,  correndo o risco de ser vítima de um disparo de arma de fogo? Realizar a  abordagem ao veículo, fazendo com que os criminosos percebam que já  foram identificados pela polícia?
A situação descrita ocorre cotidianamente na atuação policial,  um dilema que envolve o risco da própria vida, e de pessoas inocentes.  Quanto o leitor acha que vale o trabalho de quem se dispõe a passar por um risco do tipo?
Voltando à ação, digamos que tudo tenha dado certo. A guarnição  realizou a abordagem, fez a busca no veículo, encontrou o fruto do roubo  e as armas de fogo utilizadas no crime. Os suspeitos são presos em  flagrante. Na delegacia, um dos policiais reconhece um dos presos como  sendo seu vizinho, num bairro de periferia em que mora. A situação  constrange o policial, que mesmo tendo cumprido seu papel legal, teme  por uma possível represália do infrator.
No Brasil, e talvez no mundo, a desestrutura social é mãe do cometimento de certos tipos de delitos, notadamente aqueles que possuem em seu modus operandi  a violência física, às vezes letal. O policial que reside em locais  vulneráveis à criminalidade, corre o risco de ser vítima daqueles que  vêem nele o inimigo em potencial.
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Um outro policial, alguns dias depois da prisão, ao pegar um ônibus  coletivo para se deslocar a sua residência, encontra um outro integrante  da quadrilha que prendeu – provavelmente solto mediante algum remédio  jurídico que ignora a periculosidade de alguns criminosos. Os pontos vão  passando e o policial torce para que possa chegar logo em sua casa.
Porém, em determinado momento da viagem,  um assalto é anunciado, e, aparentemente, o sujeito preso outrora está  fazendo a segurança dos assaltantes. Se você fosse o policial, caro  leitor, estando armado ou não, o que acha que faria?
A melhor resposta para a pergunta seria “não estaria ali”.  Provavelmente, se o policial estivesse em seu veículo particular, teria  reduzidas as chances de passar por uma situação do tipo, pois além do  controle das pessoas que entram em seu carro, os cuidados e atitudes  preventivas na direção podem ajudar a evitar roubos e furtos.
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O policial chega a atuar como pedagogo, psicólogo e  socorrista. Sem ter tempo hábil para consultar compêndios ou  conselheiros, deve decidir rapidamente o que falar ou fazer em cada  ocorrência, que pode ser num prédio de luxo  no espaço imobiliário mais caro do país ou mesmo em meio à lama ou em  ambiente rurais. O policial precisa entender o poliglota e o analfabeto,  e dele é exigido o tratamento comum a ambos enquanto cidadãos.
Por esses e outros tantos aspectos, julgo que o policial deve ser  “bem remunerado”, mesmo achando que não há valor que pague a exposição  da vida própria e a salvação da vida alheia. Ser “bem remunerado” é dar o  mínimo de dignidade a esses homens e mulheres que devem morar bem, se  transportar bem e ter condições de frequentar, junto com sua família  também sujeita a represálias, lugares adequados a sua atividade  profissional.
A complexidade da atuação policial e o risco inerente a ela,  impossível de se eliminar completamente, são justificativas plausíveis  para que os policiais, mais do que qualquer outra categoria  profissional, sejam bem remunerados. Este é um dos primeiros passos para  o início de uma segurança pública de qualidade no país.
 
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